Na mitologia grega, as deusas do
olimpo eram igualmente temidas e respeitadas, as cinco entre os doze ou as seis
entre os quatorze citados como parte do dodecateon. Entre os seis deuses de
primeira geração, elas eram em três.
Em toda a história da raça humana
já foram e têm sido guerreiras e pacifistas, sujeitos e objetos, vítimas e cuidadoras,
mães e órfãs, livres e escravas, conhecedoras e analfabetas, ousadas e reprimidas.
Em cada contexto específico, mais umas dessas coisas que outras.
Quando o assunto é a casa, ainda
hoje o título “Dona de casa” ainda aparece como correlato feminino do título masculino
“Chefe de família”. Enquanto ele é o cabeça do lar, responsável pela logística
econômica, intelectual e decisória, ela é a responsável direta pelos serviços
domésticos e educação dos filhos. Acumula, assim, a função de babá, cozinheira,
faxineira, lavadeira, professora e muito mais. E desde a mais tenra infância já
vai aprendendo o seu lugar. Muita coisa já mudou nesse sentido, mas, ainda
hoje, mesmo as pessoas mais libertas pelas conquistas do feminismo, mantêm
sempre incrustado em seu ser algum traço deixado por toda uma história de
machismo injusto.
Se trabalho é o assunto, é já bem
constatado que, apesar de todos os avanços, as mulheres ainda são remuneradas
por valores bem inferiores aos homens quando assumem os mesmos cargos. E à
desigualdade nas remunerações, somem-se, igualmente, o reconhecimento, o
respeito, as oportunidades, a estabilidade, etc.
Se mudarmos o assunto e começarmos
a falar de sexo, aí é que a coisa pega. O homem pode tudo, sempre pôde. E à
mulher resta a condição de reprimida, de agente passivo, de objeto, de timidez,
de silêncio. Qualquer indicação de ousadia, de vontade própria, de expressão de
desejo ou necessidade de prazer, será interpretada como constatação de desvio
perverso do seu comportamento. Será nomeada vadia, puta, fácil, ou qualquer
outro desses nomes, usados em tom depreciativo, que são os equivalentes
femininos para os termos masculinos, usados em tom enaltecedor. Às vezes até o
mesmo termo ganha uma interpretação diferente em cada gênero.
Tarado: (não o de verdade, mas o
termo usado para um homem normal): Homem que expressa a sua sexualidade de
forma intensa, homem de sexualidade forte, que gosta muito de sexo, etc.
Tarada: Mulher que “dá” pra todo
mundo, puta
Devasso: Homem que “pega” muitas
mulheres, garanhão, gostosão, fodão.
Devassa: Mulher que “dá” pra todo
mundo, puta.
Pegador: Pega todas as mulheres,
garanhão, o bom, o gostosão.
Pegadora: Mulher que “dá” pra
todo mundo, puta.
Homem que diz “comi Fulana, Sicrana
e Beltrana”: Herói, garanhão, viril, sexualidade forte, etc.
Mulher que diz “dei para Funano,
Sicrano e Beltrano”: Mulher que “dá” pra todo mundo, puta.
Puta: Nas definições acima não é
a mulher que vende sexo, mas um indicativo de que a mulher não presta, é
inferior, não é gente, só serve para sexo e sexo sem respeito nem carinho, é
quase bicho, não merece ser respeitada, muitas vezes nem como ser humano, muitas
vezes merece até ser violentada, no corpo e na alma.
Puto: Homem que não é homem, gay,
portanto merece os mesmos preconceitos e violências que uma mulher, até mais.
Bem, são só alguns exemplos.
Talvez até você, liberto ou liberta pelo nosso feminismo contemporâneo, vez por
outra ainda se flagre pensando parecido. É uma pena, mas é a nossa realidade
ainda.
Se você é homem, aproveite este
dia de hoje para pensar: “quem são Elas?”. O que fariam sem elas? Como
viveriam? Como as têm tratado? Como você as enxerga? Não apenas aquelas que são
as “outras” da tua vida. E com “as outras” quero dizer aquelas que não fazem
parte da tua vida, que não se relacionam contigo. Para essas, acredite, é mais
fácil levantar bandeiras, defender direitos, lutar, expressar opiniões libertadoras
em favor delas. Mas quero, principalmente, que pensemos nas nossas mulheres, “as
umas”, essas que estão ao nosso redor, que convivem conosco. Começando pela sua
mãe, avó, esposa, filhas, tias, cunhadas, noras, estendendo-se às colegas de
trabalho, de estudo, etc. Quem são elas?
Você é mulher? Então quero te
desejar muita liberdade. Espero que você saiba quem é. Espero que o contexto
machista não tenha obscurecido a tua visão do próprio ser. Espero que saiba e
aja sabendo que és tão humana quanto qualquer homem. Desejo a você a lembrança
constante de que, seja em casa, no seu lar, seja no seu trabalho, na rua, na
escola, no comportamento, no sexo, na linguagem, nos direitos e deveres, és tão humana quanto
qualquer homem. E nunca aceite nem reproduza um pensamento ou comportamento que
interprete como mal um ato seu que, se fosse ato de um homem, seria
interpretado como bom. Se indica humanidade para ele, indica para você também.
Tenho muitas mulheres. As cinco
principais são minha mãe Ozinete, minha esposa Cristiane, minhas filhas Hanna,
Sofia e Lis. Quando me pergunto “Quem são elas para mim?”, consigo resumir
dizendo que são os maiores tesouros da minha vida. São seres e não posses. São
sujeitos e não objetos. São capazes de liderança, de decisões. São autônomas e
possuem vontades e desejos próprios. Mesmo carregando cicatrizes de uma
formação social machista, tento enxergá-las com um viés de igualdade. E desejo
que sejam mulheres libertas, sem medo, sem culpa.
A todas as mulheres, parabenizo
pelas conquistas e desejo muito mais. Desejo liberdade, plena e portadora do
prazer de viver. Desejo transformação progressiva no mote “quem elas pensam que
são?”. Que pensem, reflitam como são vistas (realidade), quem têm sido (sua história),
quem devem ser (seu Ser). Que se empoderem com ousadia, sem medo, sem culpa.
Que desconstruam, primeiro o interior de si mesmas, e depois todo o universo exterior
onde coexistem.
Perdoem-me as palavras fortes
usadas, talvez incoerentes com um texto de homenagem, mas a homenagem é
sincera, do meu jeito.
Quem é você, mulher? Quem você pensa que
é?
P.S. Muitas das comparações usadas, principalmente no assunto sobre a sexualidade, não expressa juízo de valores, nem no julgamento conferido aos homens nem às mulheres, mas simplesmente traduz o pensamento que domina na interpretação para cada gênero. Que as lutas das mulheres, ao exigir igualdade, continue não reproduzindo algumas superficialidades predominantes no pensamento masculino.
P.S. Muitas das comparações usadas, principalmente no assunto sobre a sexualidade, não expressa juízo de valores, nem no julgamento conferido aos homens nem às mulheres, mas simplesmente traduz o pensamento que domina na interpretação para cada gênero. Que as lutas das mulheres, ao exigir igualdade, continue não reproduzindo algumas superficialidades predominantes no pensamento masculino.
08 de março de 2014
Bruno Montarroyos
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