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Que bom você por aqui. Sinta-se em casa. Espero que as nossas humanidades se encontrem aqui. Neste blog você encontrará textos sobre assuntos variados que traduzam com palavras simples e críticas esses caminhos e descaminhos que a humanidade percorre na estrada da vida, expressos através de um desejo profundo e intimamente meu: Quero ser mais humano: menos hipocrisia, menos espiritualidade alienante, menos moralidade vazia, muito mais HUMANO."

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Sobre a Liberdade em Mill - Parte 3*

CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO

Através do cultivo e uso da individualidade, segundo Mill, é que os seres humanos se tornam um objeto de admiração nobre e belo. Por isso não se deve buscar a uniformização de tudo o que é individual, e sim cultivar um ambiente propício ao exercício da individualidade. Não permitir que a individualidade se desenvolva, esmagá-la, é despotismo, não importa em nome de que é feita a castração. Seja para cumprir a determinação dos homens, alegando a força da vontade da maioria. Ainda que seja sob o pretexto de estar cumprindo a vontade de Deus, a liberdade individual deve-se preservar.

O que seria da história da humanidade não fosse a liberdade individual? Tudo aquilo que conquistamos, tudo aquilo a que chamamos “progresso” é, em boa medida, fruto da individualidade. Mesmo as conquistas históricas conduzidas pelo movimento de multidões são fruto da liberdade individual de cada pessoa que compõe a luta.

É o choque entre a liberdade e os costumes estabelecidos que faz a história. É esse conflito que nos permite uma adaptação às constantes transformações que nós mesmos provocamos. “A luta entre o amor à liberdade ou ao aperfeiçoamento e o domínio do costume, constitui o interesse principal da história da humanidade”.

Mill cita Wilhelm Von Humboldt, quando este diz que há “duas condições essenciais para o desenvolvimento humano: liberdade e variedade de situações”. É interessante notar que essas duas condições apresentadas por Mill estão muito relacionadas. O que seria a variedade de situações senão o palco da tolerância à liberdade individual? Na verdade essas duas condições poderiam, sem dúvida, serem resumidas em uma só, e esta seria a liberdade do indivíduo. Se a liberdade individual está garantida, a variedade de situações será conseqüência natural e imediata disso. E a variedade de situação, ao mesmo tempo, promove novas individualidades. A variedade de situação é o palco onde as individualidades podem se desenvolver mais facilmente. E o exercício das individualidades é a condição da existência do palco que é a variedade de situação.

A homogeneização dos valores ou massificação dos costumes ou ainda, como Mill chama, uniformização dos costumes, promove um solo totalmente diverso da variedade de situação necessária ao desenvolvimento das individualidades. Mill compara sua época ao passado: “Antigamente, diferentes posições sociais, diferentes zonas residenciais, diferentes ofícios e profissões liberais viviam no que se poderá chamar mundos diferentes; atualmente, eles vivem, em grande medida, no mesmo mundo”. As pessoas compram os mesmos produtos, usam as mesmas roupas, querem os mesmos sapatos, ouvem as mesmas músicas, freqüentam os mesmos lugares e tantas outras coisas que demonstram a padronização dos costumes.

Ao explicar a importância das opiniões diversas sob um mesmo tema, Mill condiciona a certeza sobre a filosofia newtoniana (física newtoniana) à construção do pensamento em um ambiente aberto a contestações. Jamais as pessoas poderiam ter uma certeza tão grande das afirmações de Newton se não tivesse sido permitido questionar seus argumentos. Mill fala em uma época em que a física newtoniana é incontestável. E ele está falando sobre os incontestáveis do passado que às vezes pela contestação do “outro” abre caminho para um novo incontestável. Mais tarde, Einstein colocaria em xeque parte fundamental da física newtoniana.

O processo de construção do conhecimento, quando se quer conhecer profundamente sobre um assunto, é feito através do confronto de todas as opiniões diversas sobre o mesmo. A opinião diversa do outro não representa uma ameaça ao conhecimento e sim uma importante ferramenta para a verdade sobre o assunto em questão.

"[...] a única forma que um ser humano tem de tentar conhecer um assunto a fundo é escutar o que pessoas de todos os quadrantes de opinião dizem sobre o mesmo e estudar todos os ângulos por que ele pode ser observado por todas as morais [...] pois, conhecendo tudo o que pode, pelo menos de forma óbvia, ser dito contra si, e tendo tomado a sua posição em relação a todos os contraditores [...] tem o direito de pensar que a sua opinião é melhor que a de qualquer outra pessoa, ou de qualquer grupo que não tenha sido sujeito a um processo semelhante".

É o exercício da discussão que mantém vivo o significado da opinião. Ao cessar a discussão sobre um tema, os fundamentos que chegaram às conclusões de sua razão de ser são esquecidos. E a observância de tais conclusões pelas pessoas passa a ser por mera repetição, ao invés de se dar por convicção.

Saber os limites do próprio conhecimento é também essencial nesse processo de discussão e construção do conhecimento. Aquele que se propõe auto-suficiente para abarcar sozinho a complexidade e variedade dos elementos que compõem o conhecimento estão fadados à fragilidade daquilo que produz. Esse tipo de comportamento acompanha a intolerância. É a consciência dos limites do conhecimento que promove a tolerância ao diferente e a abertura a uma construção conjunta de um conhecimento mais amplo e sólido.

Pode-se encontrar nessa obra de Mill três níveis de liberdade individual: liberdade de pensamento, liberdade de expressão e liberdade de ação.

* Reflexões a partir da obra Sobre a Liberdade, de John Stuart Mill

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